Acaba Mundo

Perambulava pelas ruas,

com o corpo negro e a alma nua;

e todos o viam como a imagem de um imundo

Assim era o conhecido Acaba Mundo

Calça jeans, rasgada, era seu short

que, de tão surrado, possuía um aspecto forte

Mas a textura que sobressaía, por demais,

eram os as marcas dos açoites

praticados pelos látegos sociais

Pés descalços,

de olhar medonho,

Acaba Mundo, na verdade,

alimentava a esperança

em viver um belo sonho:

o direito em ser criança

Mas a sua puerícia fora transformada

em um adulto em miniatura;

sendo Acaba Mundo rotulado

como a mais temida criatura

O menino que outrora foi,

tornou-se emancipado

E, ao leito do rio,

o seu negro corpo fora encontrado

O mundo acabou com Acaba Mundo,

ao ceifar a sua subsistência;

deixando, porém, inacabada,

a plenitude de sua ausência

A porta

Sei que é preciso abrir a porta

Todavia, por mais que alguém a escancare,

parece que toda porta tem seus limites

Hoje, eu me deparei

olhando à porta

Por um instante,

eu pensei que a porta fosse uma coisa morta

Mas não,

mas não

A porta apenas não se comporta como porta

Apesar de seus repetitivos movimentos,

a porta parece sempre estar fechada;

não se permite a fazer outra coisa

E essa atividade

não é algo que a porta executa por si mesma

Ela é sempre manipulada por uma força externa,

submetendo-se a todo o tipo de vontades alheias

A porta precisa entender

que, abrir-se, não é o suficiente,

uma vez que a mesma pode transcender

aos limites a ela estabelecidos